sexta-feira, 12 de junho de 2015

Que bom que existem cristãos hipócritas!

Condenadas à fogueira - Wladimir Bessonov
Os cristãos brasileiros e do mundo inteiro são, em sua maioria esmagadora, hipócritas. Infelizmente nem todos os cristãos são hipócritas e os que são parecem muito menos visíveis na mídia e na sua atuação na sociedade, de forma geral. Se os cristãos sinceros se posicionassem como os cristãos hipócritas talvez conseguíssemos, um dia, tornar este país em uma nação irmanada pela racionalidade, pela ética e pela laicidade verdadeiras.
Mas há os cristãos assustadoramente sinceros. E, muito mais assustadores e perigosos, há também os líderes cristãos, na prática os principais responsáveis pelo comportamento de seus fieis sinceros.
E esses dois tipos de cristãos, os sinceros e os líderes, são os que fazem mais barulho, com consequências estarrecedoras.
Fosse o Brasil um país verdadeiramente laico, ideologicamente laico, com uma população e um governo minimamente norteados pela ética igualitária, a religião cristã já teria sido banida de qualquer esfera de influência pública, sendo apenas tolerada em seus templos, onde, inclusive, crianças jamais poderiam ser doutrinadas; que se resguarde o direito de adultos professarem sua fé, mas em espaços delimitados e apenas entre si; respeite-se os direitos dos pais à educação de seus filhos, mas que esse direito não suplante o direito das crianças a crescerem livres de condicionamentos irracionais, livres de freios ao seu intelecto e ao seu raciocínio e plenamente éticos igualitários, para que não tenhamos que conviver com a perigosíssima ameaça de muitos outros futuros cristãos sinceros, manipulados pelos líderes cristãos através da fé.
(Nota de rodapé: Outras religiões com potencial tão ou mais danoso à sociedade não estão sendo citadas neste texto por serem minoria e praticamente nada influenciarem nos caminhos políticos, sociais e econômicos do Brasil).
Cristãos hipócritas são pessoas que perceberam que não é ético nem bom que um deus mate seu filho pelos pecados humanos; que nenhum sacrifício de sangue se justifica, que não é ético nem bom que outra pessoa pague pelos pecados alheios, que pecados são noções cristãs e muito diferentes de crimes e que o que é chamado de pecado na Bíblia engloba uma gama de ações e emoções humanas as quais qualquer um está sujeito, vez ou outra, sem ser necessariamente uma péssima pessoa, pois faz parte da natureza humana sentir raiva, ciúme, inveja, desejo sexual, preguiça, rancor, cometer erros de julgamento e de conduta.
Os cristãos hipócritas são pessoas que perceberam que um assassino não deixa de ser assassino por ser invisível, por se autos sacrificar a si mesmo, por ter supostamente nascido de uma virgem ou por ter dito "amai ao próximo como a ti mesmo", enquanto tranquilamente afirma que se não for aceito e adorado por alguém, esse alguém será condenado eternamente.
Que a maioria dos cristãos seja hipócrita é bom, é ótimo e indispensável para que possamos estar a salvo de uma teocracia regida por legislações baseadas na Bíblia, onde abundam as penas de morte por "crime" ideológico/religioso e por orientação, prática e comportamento sexuais.
Cristãos hipócritas são pessoas que foram criadas em lares com forte influência do pensamento católico ou evangélico, que participaram ou participam dos rituais dessas crenças, que creem no deus pai e em Jesus, o deus filho, e no Espírito Santo, o deus fantasma; mas que, pelo poder do pensamento humano, função das mais desenvolvidas do cérebro, fazem uso de sua racionalidade e de suas ética e empatia. Tendo lido a Bíblia, decidiram por própria conta que não a seguiriam a risca. Cristãos hipócritas compreenderam que nada daquilo realmente representa a palavra de um deus todo poderoso, amoroso, bom e ético e praticam uma espécie de fé ético-seletiva: creem no deus judaico-cristão, mas escolhem seguir apenas as partes mais bonitinhas da Bíblia e sabem que há as partes simplesmente terríveis demais ou imbecis demais para serem levadas a serio; ou percebem quais são as partes impraticáveis na sociedade em que vivem, pois são incitações a sacrifícios inúteis, esperanças de justiça em outra vida, discursos de ódio, violências psicológicas e físicas e toda a variedade de crimes. Sabem que, caso ajam como diz a Bíblia, serão presos ou se isolarão do convívio social saudável.
Como os versículos do Novo Testamento que dizem para os cristãos darem a outra face quando forem agredidos, venderem tudo o que possuem e darem aos pobres e não acumularem riquezas; assim quando forem assaltados deverão entregar o fruto de seu trabalho não só no que for extorquido mas o dobro, não reclamar da dominação política injusta e corrupta nem dos impostos injustos, ou como aquela parte em que Jesus diz que cristãos não devem sequer saudar os não cristãos, que devem se afastar de quem não segue a mesma fé; assim também no Sermão da Montanha, em que Jesus proclama que todas as bem-aventuranças virão após a morte, em outra vida, e por isso os cristãos devem se conformar com o sofrimento e a injustiça do mundo.
Tudo isso um cristão hipócrita escolhe deixar de lado, assim como deixa de lado as orientações bíblicas do Velho Testamento referentes à cura de doenças por meio de sacrifícios de animais, apedrejamentos, sexo antes de casar e só para procriação dentro do casamento, divórcio, adultério, vários casamentos, educação dos filhos, segregação de homossexuais, de mulheres, de pessoas com deficiência e até mesmo escravização de seres humanos e outras barbaridades.
Cristãos hipócritas são pessoas que possuem um senso de ética muito superior ao do deus bíblico e ao dos cristãos sinceros, os fundamentalistas, que são os verdadeiros cristãos. Fundamentalistas são assim chamados erroneamente como sinônimo de fanáticos (NOTA: fa·ná·ti·co - adjetivo e substantivo masculino 1. Diz-se da pessoa animada por um zelo excessivo por uma religião ou uma opinião. 2. Que se julga inspirado. 3. [Figurado]  Loucamente apaixonado; desvairado. "fanático", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013[1])
Não é que um cristão fundamentalista seja um fanático enlouquecido que comete atrocidades por estar fora de si, fora da realidade ou por ser um cretino, que decidiu deturpar a palavra benevolente do seu deus bonzinho. Fundamentalismo não é excesso de zelo ou loucura.
O motivo de um cristão fundamentalista pensar e agir como age e pensa é por desejar sinceramente seguir os fundamentos de sua religião.
Ora, quem fundou a religião judaico-cristã foi, para os cristãos, o próprio Deus! Logo, o que há de errado em um cristão fundamentalista? Os fundamentos de sua religião, é claro! As bases do Cristianismo são o que há de errado no Cristianismo, não alguma meia dúzia de loucos desvairados com excesso de zelo religioso.
Caso sua religião tivesse realmente seus fundamentos baseados na empatia, no amor incondicional ao próximo, na caridade com todos os seres, na convivência pacífica com outros povos e outras religiões, na compreensão de que cabe ao indivíduo e não a um deus definir se ele vai ou não crer nesse deus... bem, se o Cristianismo tivesse esses belos fundamentos, um cristão fundamentalista seria tão bom quanto é na realidade um cristão hipócrita. Um cristão hipócrita não aceita os fundamentos do Cristianismo, que bom que existem cristãos hipócritas!
O cristão fundamentalista está seguindo os fundamentos de Deus, ou seja, está convicto e é sinceramente arrogante de se considerar como o "sal da Terra", o mensageiro de um deus (ide e pregai o evangelho) e, por isso, por Deus estar indubitavelmente do seu lado, arvora-se o direito e o dever de fazer cumprir a vontade de seu deus! De perseguir, discriminar e até mesmo agredir e assassinar quem não está do mesmo lado que ele, afinal, ele leu a Bíblia e lá, tanto no Velho como no Novo Testamento, está escrito que apenas os seguidores daquele deus e de seu filho têm direito à vida. Foi o próprio Deus que lhe deu essas certezas. "Converta-se ou morra!" Eis a mensagem que o cristão sincero recebe de seu deus e repassa aos que lhe rodeiam, das piores formas possíveis.
Ele não pratica a hipocrisia, sua crença é sincera e na verdade ele estará apenas seguindo tudo o que seu deus psicopata manda e faz, pois ele seguirá os fundamentos do Cristianismo totalmente convicto de que TODAS aquelas histórias, leis e conceitos são mais do que reais, são inspirados por um deus criador de tudo; estará totalmente feliz e satisfeito por estar fazendo a vontade de seu deus; com a consciência apaziguada pela certeza de que é homofóbico a mando de Deus, é machista a mando de Deus, é racista a mando de Deus, mata infiéis mando de Deus.
Cristãos sinceros não são muito fáceis de diferenciar de psicopatas, já que o seu deus age como um. Aparecem na imprensa por terem matado vizinhos, por terem abusado sexualmente de crianças e adultos, por terem espancado os filhos, por terem agredido verbal e fisicamente crianças, negros, ateus, mulheres, gays, lésbicas e pessoas transgêneras. Os cristãos sinceros fazem tudo isso a mando de Deus, pois a Bíblia lhes diz que deus não se incomoda e até ordena que seu primeiro povo escolhido e santo escravize meninas virgens para "casamento" (leia-se abuso sexual, estupro); o deus dos cristãos não se incomoda e até ordena o apedrejamento de pessoas de outras culturas ou que, de uma forma ou de outra, não o obedecem, não o seguem, não creem nele e/ou creem em outros deuses. Esse deus não se incomoda que uma criança seja estuprada, pois respeita o livre arbítrio do agressor e o julgará no Fim dos Tempos e as suas vítimas receberão dádivas no Céu, lado a lado com seu estuprador, caso ele se arrependa na hora da morte.
Um cristão sincero age como agem os psicopatas, sem empatia, sem ética, sem pudor, sem peso na consciência, pois... sim, eles agem assim por crerem sinceramente que estão cumprindo a vontade do seu deus! Que se igualam a ele, que são especiais, incompreendidos, perseguidos pelos que não são psicopatas, pelos que defendem a igualdade de todas as pessoas... Deus NÃO DEFENDE a igualdade de todas as pessoas, não perdoa a não ser que receba em troca total devoção e obediência, inclusive na forma do assassinato do próprio filho: "Se meu deus mandou, é certo e eu faço, pois Deus age em mistérios e eu sou um cristão sincero, eu creio no meu deus verdadeiramente!"
Cristãos hipócritas? Não! De jeito nenhum! Eles jamais matariam seus filhos a mando de um deus.
Pessoas éticas, boas, empáticas, que primam pela racionalidade e que são socialmente responsáveis exercitam sua lógica contra a crença que herdaram de seus pais ou de seu meio social e fazem suas análises racionais, transformadas em escolhas atitudinais, comprometidas com a ética, coisa que o deus bíblico e seu filho não possuem; é como se pensassem sem jamais terem coragem de verbalizar: "Sou cristão, mas não sigo, não posso seguir as palavras bíblicas pois aquelas palavras são incorretas histórica e cientificamente, são palavras homofóbicas, são racistas, são machistas, vingativas, cruéis e sanguinárias". E estão certos!
Se os cristãos brasileiros e de outros países não fossem hipócritas, estaríamos possivelmente vivendo no ocidente uma realidade muito parecida com a dos Estados Islâmicos teocráticos, nos quais todas as pessoas são obrigadas a viver de acordo com essa religião. Se a maioria dos cristãos brasileiros não fossem hipócritas até pessoas de outras culturas e países estariam expostas a sofrerem ameaças de morte por desenharem Jesus ou zombarem de Deus, assim como os islâmicos fazem proclamando pena de morte para pessoas do ocidente que, naquela mentalidade religiosa, ofendem a Maomé, ao desenhá-lo de forma satírica e/ou crítica.
É mesmo indispensável que os cristãos cultivem essa hipocrisia que lhes diz que nem Deus pai nem Jesus merecem que cometam preconceitos, perseguições, agressões e assassinatos em seus nomes.
Esse tipo de hipocrisia cristã é o que eu chamo de 'hipocrisia do bem', pois é determinada pela percepção racional de que, ainda que a fé religiosa traga algum consolo a este ou aquele indivíduo condicionado a se sentir consolado pela existência de um deus, essa fé não é suficiente para suplantar a igualdade de direitos de todos os seres humanos.
É uma hipocrisia movida pela razão, em oposição à sinceridade movida pela fé.
É uma hipocrisia que demonstra que, na verdade, a única forma ética de se seguir ao deus bíblico, ao deus filho, ao deus fantasma ou a qualquer deus já imaginado pela humanidade é sendo hipócrita e não levando sua fé muito a sério. Uma ida ao templo, uma doaçãozinha aos pobres, casamento, batismo, crisma, extrema unção e só. Nada de se tornar um cristão sincero! Não... A crença cristã sincera é perigosíssima para a vida em sociedade.
Mas não temos, infelizmente, apenas cristãos hipócritas, os éticos. Além dos terríveis cristãos sinceros, temos ainda os líderes cristãos!
Católicos ou evangélicos, os líderes cristãos são, numa escala maior do que a dos cristãos sinceros, o maior perigo para as sociedades.
Os líderes cristãos não são cristãos hipócritas-do-bem; são hipócritas criminosos. Praticam a mesma fé seletiva que os cristãos hipócritas-do-bem praticam, mas enquanto estes são movidos pela ética, aqueles são movidos por interesses pessoais que colocam acima da humanidade, praticando crimes contra a dignidade, contra a liberdade e contra a vida humanas. Líderes cristãos são hipócritas criminosos e praticam a fé selecionada pelo seu desejo de poder e a manutenção deste, pois entre outras coisas, esquecem convenientemente que seu deus desqualifica a riqueza material e amealham riquezas tirando-as justamente daqueles a quem deveriam doar, segundo seu próprio livro.
São os líderes cristãos que incentivam o ódio, o preconceito e a educação não científica das crianças, preocupados que estão com a continuidade e aumento de seu rebanho de pessoas facilmente manipuláveis, desacostumadas a usar a razão desde cedo.
São os líderes cristãos que, do alto de seu poderio ideológico/econômico/político interferem nas leis do país, via de regra compactuando com as violências cometidas pelos seus iguais e com a morte de crianças e mulheres, gays/lésbicas e de pessoas transexuais, praticando e acobertando crimes como abuso sexual de menores e mesmo de adultos/as, lavagem de dinheiro do tráfico de drogas, do mercado de escravos humanos, e outras corrupções políticas e econômicas nas trocas de privilégios para a manutenção de seu poder.
Ao darem declarações públicas em grandes shows midiáticos, propiciam de forma criminosa a disseminação de doenças sexualmente transmissíveis e fatais, como a AIDS; dão aval moral para a perseguição e a mutilação e/ou assassinato de pessoas de religiosidade afro-brasileira e mesmo na própria África incentivam a caça às feiticeiras por seus pastores e padres; endossam assassinatos baseados em denominações cristãs; incentivam violências baseadas em gênero, orientação sexual e identidade de gênero, quando homofóbicos/lesbofóbicos e transfóbicos sentem que têm o embasamento nas leis de Deus para agirem; são os líderes cristãos que se posicionam contra o aborto e que possibilitam a inversão de valor da vida, colocando a intrauterina como sendo mais santa do que a vida da mulher que engravidou por engano ou falha do método contraceptivo, ou mesmo por ter sido estuprada pelo companheiro abusador (que também é legitimado pela Bíblia).
Líderes religiosos são os verdadeiros responsáveis pelos crimes dos cristãos sinceros, quando personificam-se como enviados de um deus cujas leis assumidamente são as únicas verdadeiras; as palavras de um livro são então santificadas, e tudo o que se fizer a partir delas, será em consonância com o suborno maior: aja como eu digo que Deus quer e terá a vida eterna após a morte.
A religião cristã, como um todo e nas pessoas de seus líderes, é a verdadeira responsável pelos desmandos sinceros de seus fieis.
Quanto mais proteção e respeito se exige a esta religião, menos proteção e respeito se garante aos direitos individuais expressos na Constituição a todas a população brasileira, sejam pessoas de qualquer etnia, sejam ateias ou de outras religiões, sejam cisgêneras ou transgêneras, sejam de qual gênero for, seja qual for a sua identidade de gênero e a sua orientação sexual, neste país que deveria ser laico, não apenas na letra da lei, mas em todas as suas instâncias ideológicas, econômicas e político-sociais.

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