Condenadas à fogueira - Wladimir Bessonov |
Os cristãos
brasileiros e do mundo inteiro são, em sua maioria esmagadora, hipócritas.
Infelizmente nem todos os cristãos são hipócritas e os que são parecem muito
menos visíveis na mídia e na sua atuação na sociedade, de forma geral. Se os
cristãos sinceros se posicionassem como os cristãos hipócritas talvez
conseguíssemos, um dia, tornar este país em uma nação irmanada pela
racionalidade, pela ética e pela laicidade verdadeiras.
Mas há os
cristãos assustadoramente sinceros. E, muito mais assustadores e perigosos, há
também os líderes cristãos, na prática os principais responsáveis pelo
comportamento de seus fieis sinceros.
E esses dois
tipos de cristãos, os sinceros e os líderes, são os que fazem mais barulho, com
consequências estarrecedoras.
Fosse o Brasil
um país verdadeiramente laico, ideologicamente laico, com uma população e um
governo minimamente norteados pela ética igualitária, a religião cristã já
teria sido banida de qualquer esfera de influência pública, sendo apenas
tolerada em seus templos, onde, inclusive, crianças jamais poderiam ser
doutrinadas; que se resguarde o direito de adultos professarem sua fé, mas em
espaços delimitados e apenas entre si; respeite-se os direitos dos pais à
educação de seus filhos, mas que esse direito não suplante o direito das
crianças a crescerem livres de condicionamentos irracionais, livres de freios
ao seu intelecto e ao seu raciocínio e plenamente éticos igualitários, para que
não tenhamos que conviver com a perigosíssima ameaça de muitos outros futuros
cristãos sinceros, manipulados pelos líderes cristãos através da fé.
(Nota de
rodapé: Outras religiões com potencial tão ou mais danoso à sociedade não estão
sendo citadas neste texto por serem minoria e praticamente nada influenciarem
nos caminhos políticos, sociais e econômicos do Brasil).
Cristãos
hipócritas são pessoas que perceberam que não é ético nem bom que um deus mate
seu filho pelos pecados humanos; que nenhum sacrifício de sangue se justifica,
que não é ético nem bom que outra pessoa pague pelos pecados alheios, que
pecados são noções cristãs e muito diferentes de crimes e que o que é chamado
de pecado na Bíblia engloba uma gama de ações e emoções humanas as quais
qualquer um está sujeito, vez ou outra, sem ser necessariamente uma péssima
pessoa, pois faz parte da natureza humana sentir raiva, ciúme, inveja, desejo
sexual, preguiça, rancor, cometer erros de julgamento e de conduta.
Os cristãos
hipócritas são pessoas que perceberam que um assassino não deixa de ser
assassino por ser invisível, por se autos sacrificar a si mesmo, por ter
supostamente nascido de uma virgem ou por ter dito "amai ao próximo como a
ti mesmo", enquanto tranquilamente afirma que se não for aceito e adorado
por alguém, esse alguém será condenado eternamente.
Que a maioria
dos cristãos seja hipócrita é bom, é ótimo e indispensável para que possamos
estar a salvo de uma teocracia regida por legislações baseadas na Bíblia, onde
abundam as penas de morte por "crime" ideológico/religioso e por
orientação, prática e comportamento sexuais.
Cristãos
hipócritas são pessoas que foram criadas em lares com forte influência do
pensamento católico ou evangélico, que participaram ou participam dos rituais
dessas crenças, que creem no deus pai e em Jesus, o deus filho, e no Espírito
Santo, o deus fantasma; mas que, pelo poder do pensamento humano, função das
mais desenvolvidas do cérebro, fazem uso de sua racionalidade e de suas ética e
empatia. Tendo lido a Bíblia, decidiram por própria conta que não a seguiriam a
risca. Cristãos hipócritas compreenderam que nada daquilo realmente representa
a palavra de um deus todo poderoso, amoroso, bom e ético e praticam uma espécie
de fé ético-seletiva: creem no deus judaico-cristão, mas escolhem seguir apenas
as partes mais bonitinhas da Bíblia e sabem que há as partes simplesmente
terríveis demais ou imbecis demais para serem levadas a serio; ou percebem
quais são as partes impraticáveis na sociedade em que vivem, pois são
incitações a sacrifícios inúteis, esperanças de justiça em outra vida,
discursos de ódio, violências psicológicas e físicas e toda a variedade de
crimes. Sabem que, caso ajam como diz a Bíblia, serão presos ou se isolarão do
convívio social saudável.
Como os
versículos do Novo Testamento que dizem para os cristãos darem a outra face
quando forem agredidos, venderem tudo o que possuem e darem aos pobres e não
acumularem riquezas; assim quando forem assaltados deverão entregar o fruto de
seu trabalho não só no que for extorquido mas o dobro, não reclamar da
dominação política injusta e corrupta nem dos impostos injustos, ou como aquela
parte em que Jesus diz que cristãos não devem sequer saudar os não cristãos,
que devem se afastar de quem não segue a mesma fé; assim também no Sermão da
Montanha, em que Jesus proclama que todas as bem-aventuranças virão após a
morte, em outra vida, e por isso os cristãos devem se conformar com o
sofrimento e a injustiça do mundo.
Tudo isso um
cristão hipócrita escolhe deixar de lado, assim como deixa de lado as
orientações bíblicas do Velho Testamento referentes à cura de doenças por meio
de sacrifícios de animais, apedrejamentos, sexo antes de casar e só para
procriação dentro do casamento, divórcio, adultério, vários casamentos,
educação dos filhos, segregação de homossexuais, de mulheres, de pessoas com
deficiência e até mesmo escravização de seres humanos e outras barbaridades.
Cristãos
hipócritas são pessoas que possuem um senso de ética muito superior ao do deus
bíblico e ao dos cristãos sinceros, os fundamentalistas, que são os verdadeiros
cristãos. Fundamentalistas são assim chamados erroneamente como sinônimo de
fanáticos (NOTA: fa·ná·ti·co - adjetivo e substantivo masculino 1. Diz-se da
pessoa animada por um zelo excessivo por uma religião ou uma opinião. 2. Que se
julga inspirado. 3. [Figurado]
Loucamente apaixonado; desvairado. "fanático", in Dicionário
Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013[1])
Não é que um
cristão fundamentalista seja um fanático enlouquecido que comete atrocidades
por estar fora de si, fora da realidade ou por ser um cretino, que decidiu
deturpar a palavra benevolente do seu deus bonzinho. Fundamentalismo não é
excesso de zelo ou loucura.
O motivo de um
cristão fundamentalista pensar e agir como age e pensa é por desejar
sinceramente seguir os fundamentos de sua religião.
Ora, quem
fundou a religião judaico-cristã foi, para os cristãos, o próprio Deus! Logo, o
que há de errado em um cristão fundamentalista? Os fundamentos de sua religião,
é claro! As bases do Cristianismo são o que há de errado no Cristianismo, não
alguma meia dúzia de loucos desvairados com excesso de zelo religioso.
Caso sua
religião tivesse realmente seus fundamentos baseados na empatia, no amor
incondicional ao próximo, na caridade com todos os seres, na convivência
pacífica com outros povos e outras religiões, na compreensão de que cabe ao
indivíduo e não a um deus definir se ele vai ou não crer nesse deus... bem, se
o Cristianismo tivesse esses belos fundamentos, um cristão fundamentalista
seria tão bom quanto é na realidade um cristão hipócrita. Um cristão hipócrita
não aceita os fundamentos do Cristianismo, que bom que existem cristãos
hipócritas!
O cristão
fundamentalista está seguindo os fundamentos de Deus, ou seja, está convicto e
é sinceramente arrogante de se considerar como o "sal da Terra", o
mensageiro de um deus (ide e pregai o evangelho) e, por isso, por Deus estar
indubitavelmente do seu lado, arvora-se o direito e o dever de fazer cumprir a
vontade de seu deus! De perseguir, discriminar e até mesmo agredir e assassinar
quem não está do mesmo lado que ele, afinal, ele leu a Bíblia e lá, tanto no
Velho como no Novo Testamento, está escrito que apenas os seguidores daquele
deus e de seu filho têm direito à vida. Foi o próprio Deus que lhe deu essas
certezas. "Converta-se ou morra!" Eis a mensagem que o cristão
sincero recebe de seu deus e repassa aos que lhe rodeiam, das piores formas
possíveis.
Ele não
pratica a hipocrisia, sua crença é sincera e na verdade ele estará apenas
seguindo tudo o que seu deus psicopata manda e faz, pois ele seguirá os
fundamentos do Cristianismo totalmente convicto de que TODAS aquelas histórias,
leis e conceitos são mais do que reais, são inspirados por um deus criador de
tudo; estará totalmente feliz e satisfeito por estar fazendo a vontade de seu
deus; com a consciência apaziguada pela certeza de que é homofóbico a mando de
Deus, é machista a mando de Deus, é racista a mando de Deus, mata infiéis mando
de Deus.
Cristãos
sinceros não são muito fáceis de diferenciar de psicopatas, já que o seu deus
age como um. Aparecem na imprensa por terem matado vizinhos, por terem abusado
sexualmente de crianças e adultos, por terem espancado os filhos, por terem
agredido verbal e fisicamente crianças, negros, ateus, mulheres, gays, lésbicas
e pessoas transgêneras. Os cristãos sinceros fazem tudo isso a mando de Deus,
pois a Bíblia lhes diz que deus não se incomoda e até ordena que seu primeiro
povo escolhido e santo escravize meninas virgens para "casamento"
(leia-se abuso sexual, estupro); o deus dos cristãos não se incomoda e até
ordena o apedrejamento de pessoas de outras culturas ou que, de uma forma ou de
outra, não o obedecem, não o seguem, não creem nele e/ou creem em outros
deuses. Esse deus não se incomoda que uma criança seja estuprada, pois respeita
o livre arbítrio do agressor e o julgará no Fim dos Tempos e as suas vítimas
receberão dádivas no Céu, lado a lado com seu estuprador, caso ele se arrependa
na hora da morte.
Um cristão
sincero age como agem os psicopatas, sem empatia, sem ética, sem pudor, sem
peso na consciência, pois... sim, eles agem assim por crerem sinceramente que
estão cumprindo a vontade do seu deus! Que se igualam a ele, que são especiais,
incompreendidos, perseguidos pelos que não são psicopatas, pelos que defendem a
igualdade de todas as pessoas... Deus NÃO DEFENDE a igualdade de todas as
pessoas, não perdoa a não ser que receba em troca total devoção e obediência,
inclusive na forma do assassinato do próprio filho: "Se meu deus mandou, é
certo e eu faço, pois Deus age em mistérios e eu sou um cristão sincero, eu
creio no meu deus verdadeiramente!"
Cristãos hipócritas?
Não! De jeito nenhum! Eles jamais matariam seus filhos a mando de um deus.
Pessoas
éticas, boas, empáticas, que primam pela racionalidade e que são socialmente
responsáveis exercitam sua lógica contra a crença que herdaram de seus pais ou
de seu meio social e fazem suas análises racionais, transformadas em escolhas
atitudinais, comprometidas com a ética, coisa que o deus bíblico e seu filho
não possuem; é como se pensassem sem jamais terem coragem de verbalizar:
"Sou cristão, mas não sigo, não posso seguir as palavras bíblicas pois
aquelas palavras são incorretas histórica e cientificamente, são palavras
homofóbicas, são racistas, são machistas, vingativas, cruéis e
sanguinárias". E estão certos!
Se os cristãos
brasileiros e de outros países não fossem hipócritas, estaríamos possivelmente
vivendo no ocidente uma realidade muito parecida com a dos Estados Islâmicos
teocráticos, nos quais todas as pessoas são obrigadas a viver de acordo com
essa religião. Se a maioria dos cristãos brasileiros não fossem hipócritas até
pessoas de outras culturas e países estariam expostas a sofrerem ameaças de
morte por desenharem Jesus ou zombarem de Deus, assim como os islâmicos fazem
proclamando pena de morte para pessoas do ocidente que, naquela mentalidade
religiosa, ofendem a Maomé, ao desenhá-lo de forma satírica e/ou crítica.
É mesmo
indispensável que os cristãos cultivem essa hipocrisia que lhes diz que nem
Deus pai nem Jesus merecem que cometam preconceitos, perseguições, agressões e
assassinatos em seus nomes.
Esse tipo de
hipocrisia cristã é o que eu chamo de 'hipocrisia do bem', pois é determinada
pela percepção racional de que, ainda que a fé religiosa traga algum consolo a
este ou aquele indivíduo condicionado a se sentir consolado pela existência de
um deus, essa fé não é suficiente para suplantar a igualdade de direitos de
todos os seres humanos.
É uma
hipocrisia movida pela razão, em oposição à sinceridade movida pela fé.
É uma
hipocrisia que demonstra que, na verdade, a única forma ética de se seguir ao
deus bíblico, ao deus filho, ao deus fantasma ou a qualquer deus já imaginado
pela humanidade é sendo hipócrita e não levando sua fé muito a sério. Uma ida
ao templo, uma doaçãozinha aos pobres, casamento, batismo, crisma, extrema
unção e só. Nada de se tornar um cristão sincero! Não... A crença cristã
sincera é perigosíssima para a vida em sociedade.
Mas não temos,
infelizmente, apenas cristãos hipócritas, os éticos. Além dos terríveis
cristãos sinceros, temos ainda os líderes cristãos!
Católicos ou
evangélicos, os líderes cristãos são, numa escala maior do que a dos cristãos
sinceros, o maior perigo para as sociedades.
Os líderes
cristãos não são cristãos hipócritas-do-bem; são hipócritas criminosos.
Praticam a mesma fé seletiva que os cristãos hipócritas-do-bem praticam, mas
enquanto estes são movidos pela ética, aqueles são movidos por interesses
pessoais que colocam acima da humanidade, praticando crimes contra a dignidade,
contra a liberdade e contra a vida humanas. Líderes cristãos são hipócritas
criminosos e praticam a fé selecionada pelo seu desejo de poder e a manutenção
deste, pois entre outras coisas, esquecem convenientemente que seu deus
desqualifica a riqueza material e amealham riquezas tirando-as justamente
daqueles a quem deveriam doar, segundo seu próprio livro.
São os líderes
cristãos que incentivam o ódio, o preconceito e a educação não científica das
crianças, preocupados que estão com a continuidade e aumento de seu rebanho de
pessoas facilmente manipuláveis, desacostumadas a usar a razão desde cedo.
São os líderes
cristãos que, do alto de seu poderio ideológico/econômico/político interferem
nas leis do país, via de regra compactuando com as violências cometidas pelos
seus iguais e com a morte de crianças e mulheres, gays/lésbicas e de pessoas
transexuais, praticando e acobertando crimes como abuso sexual de menores e
mesmo de adultos/as, lavagem de dinheiro do tráfico de drogas, do mercado de
escravos humanos, e outras corrupções políticas e econômicas nas trocas de
privilégios para a manutenção de seu poder.
Ao darem
declarações públicas em grandes shows midiáticos, propiciam de forma criminosa
a disseminação de doenças sexualmente transmissíveis e fatais, como a AIDS; dão
aval moral para a perseguição e a mutilação e/ou assassinato de pessoas de
religiosidade afro-brasileira e mesmo na própria África incentivam a caça às
feiticeiras por seus pastores e padres; endossam assassinatos baseados em
denominações cristãs; incentivam violências baseadas em gênero, orientação
sexual e identidade de gênero, quando homofóbicos/lesbofóbicos e transfóbicos
sentem que têm o embasamento nas leis de Deus para agirem; são os líderes
cristãos que se posicionam contra o aborto e que possibilitam a inversão de
valor da vida, colocando a intrauterina como sendo mais santa do que a vida da
mulher que engravidou por engano ou falha do método contraceptivo, ou mesmo por
ter sido estuprada pelo companheiro abusador (que também é legitimado pela
Bíblia).
Líderes
religiosos são os verdadeiros responsáveis pelos crimes dos cristãos sinceros,
quando personificam-se como enviados de um deus cujas leis assumidamente são as
únicas verdadeiras; as palavras de um livro são então santificadas, e tudo o
que se fizer a partir delas, será em consonância com o suborno maior: aja como
eu digo que Deus quer e terá a vida eterna após a morte.
A religião
cristã, como um todo e nas pessoas de seus líderes, é a verdadeira responsável
pelos desmandos sinceros de seus fieis.
Quanto mais
proteção e respeito se exige a esta religião, menos proteção e respeito se
garante aos direitos individuais expressos na Constituição a todas a população
brasileira, sejam pessoas de qualquer etnia, sejam ateias ou de outras
religiões, sejam cisgêneras ou transgêneras, sejam de qual gênero for, seja
qual for a sua identidade de gênero e a sua orientação sexual, neste país que
deveria ser laico, não apenas na letra da lei, mas em todas as suas instâncias
ideológicas, econômicas e político-sociais.
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