A batalha dos Guararapes - Victor Meirelles de Lima |
Opor movimentos pelos direitos das minorias e pelos direitos
de grupos oprimidos ao movimento humanista é um contra-senso. Não são a mesma
coisa mas fazem parte do mesmo escopo ideológico segundo o qual todos têm
direitos iguais, independente de identidade de gênero, orientação sexual, cor
da pele ou etnia, religião ou não crença ou classe social.
Por definição, todos os movimentos que lutam por direitos
iguais para as minorias e para os grupos historicamente oprimidos se incluem no
humanismo.
Tentar desqualificar as lutas dos oprimidos conclamando-os a
lutarem ‘apenas’ pelo humanismo e não pelas suas necessidades específicas e
contra as opressões direcionadas que sofrem é contribuir para sua
discriminação, diminuindo o peso dessas opressões e banalizando os vários tipos
de violência a que esses grupos estão sujeitos simplesmente por não fazerem
parte dos grupos dominantes.
A luta dos negros é específica; a luta das mulheres é
específica; a luta dos ateus é específica; a luta de gays, lésbicas, bissexuais
e transgêneros é específica; a luta dos trabalhadores é específica. E todas
essas lutas são, em última instância, em prol do humanismo.
A nossa sociedade ocidental foi estruturada sob o ponto de
vista do homem branco e heterossexual; além disso, somos em maioria governados
dentro do sistema capitalista e ainda sob a égide do Cristianismo. Sendo assim,
qualquer indivíduo ou grupo humano que não seja homem, branco e heterossexual,
que não seja cristão e que não detenha o capital e os meios de produção se enquadrará
nas características denominadas hoje de minorias ou oprimidos.
O ateísmo é uma circunstância de quem não crê em deus ou
deuses. Sendo nossa sociedade majoritariamente cristã, indivíduos ateus se
enquadram também como minoria social. Ateus defendendo as diferenças de
tratamento social e de direitos entre homens e mulheres não os torna menos
ateus, mas certamente demonstra que não são humanistas; assim também ateus
defendendo a diferença de tratamento e de direitos entre heteros e LGBTs, e
entre brancos e negros.
Cada movimento luta pela sua visibilidade, pelos seus
direitos e pela sua representatividade na sociedade em igualdade de condições
para com o setor social dominante e contra essa diferença opressora. Ateus,
negros, trabalhadores, mulheres, índios, gays, lésbicas, bissexuais e
transgêneros se organizam em torno da ideia humanista de que todos os seres
humanos são verdadeiramente iguais em direitos.
Alguém pode questionar o porquê de não se incluir nessa
lista os cristãos, os latifundiários e empresários, os homens brancos e os
heterossexuais…
Por que esses grupos não fazem parte das minorias, nem dos
oprimidos; o que não quer dizer que não sejam oprimidos em alguma instância ou
que sejam eles sempre opressores, ou que oprimam conscientemente todos os
outros. Dizer que um indivíduo ou um grupo é dominante e historicamente
opressor quer dizer que desfrutam de privilégios sociais desde que nasceram,
independentemente de concordarem ou não com o status quo
macho-hetero-branco-cristão-capitalista da nossa sociedade.
Assim, quando brancos se posicionam contra o movimento dos
negros contra o racismo, alegando que praticam um ‘racismo contrário’, quando
homens se posicionam contra o movimento feminista alegando que praticam a
‘misandria’, quando heterossexais se posicionam contra os movimentos LGBTs alegando
que pretendem uma ‘ditadura gay’, quando cristãos se posicionam contra o
ateísmo alegando que são ‘imorais e pecadores’ e quando capitalistas se
posicionam contra os movimentos dos trabalhadores alegando a ‘meritocracia’
estão, todos esses opositores, na verdade, lutando para manter seus
privilégios, a que estão tão acostumados que os vêem como naturais, imutáveis,
corretos e mesmo – pasmem! – necessários para o bom andamento da sociedade.
Qualquer indivíduo que se pretenda humanista terá, por
definição, a obrigação ética de apoiar as lutas das minorias e dos grupos
oprimidos, sem questionar sua legitimidade e sem pretender definir suas lutas
ou como elas devem ser praticadas. Qualquer um que oponha as lutas das minorias
e dos grupos oprimidos ao humanismo, como se estes fossem excludentes, ou não
conhece essas lutas a fundo ou não conhece as características humanistas a
fundo.
Para praticar o humanismo não é necessário diluir as lutas
específicas de outros grupos mas, ao contrário, fortalecê-las apoiando-as,
conhecendo-as e contribuindo para que, de luta em luta, de conquista em
conquista, o humanismo possa, um dia, ser uma prática cotidiana, transformando
nossa sociedade em uma sociedade verdadeiramente igualitária.
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